Difal-ICMS 2022: Da origem da alíquota à origem da Polêmica.

O que é e como surgiu a polêmica envolvendo esta alíquota do ICMS



Introdução

Para melhor compreensão do conteúdo a ser tratado aqui é necessário inicialmente abordar a origem desta alíquota do ICMS e do próprio tributo em si, porém, o foco será sobre Difal-ICMS.

O legislador constituinte previu a necessidade da criação de um imposto que, a grosso modo, incidisse sobre circulação de bens e serviços, tanto que insculpiu a sua previsão no art. 155, II da Constituição Federal. Essa determinação constitucional só foi atendida após a vigência da Lei Complementar 87/96 (Lei Kandir) que regulamentou o ICMS e, com isso, criou a alíquota Difal-ICMS.

Como era antes e como é agora?

O Difal, como é popularmente conhecido, sofreu algumas alterações do momento da sua criação até a presente data. Essas alterações surgiram devido ao exponencial aumento do comércio eletrônico, pois até então o comprador da mercadoria pagava o ICMS sendo que este ficava integralmente no Estado de origem da transação (SCAFF, 2022). Levando-se em consideração o nível de competitividade que o e-commerce proporciona, os demais entes estaduais acabavam por ficar prejudicados, levando-se em conta que a grande maioria das empresas deste ramo tem a sua sede localizada no Sudeste brasileiro.

Uma dessas alterações ocorreu com a vigência da Emenda Constitucional 87/2015, que juntamente com o Convênio Confaz 93/2015, determinaram que os Estados deveriam dividir o valor do ICMS a ser recolhido. Isto aconteceu de forma progressiva, como expôs a Constituição Federal no art. 99. Esta regra é aplicada até os dias de hoje.

Qual é o motivo da polêmica envolvendo o Difal-ICMS?

Tudo começou quando os contribuintes perceberam que estavam sendo prejudicados pela postura adotada pelos Estados. Diante disso, judicializaram a questão e o STF em 2021 reconheceu, no âmbito da ADI 5469 e no RE 1.287.019/DF, que “a EC 87/2015 criou uma nova relação jurídico-tributária entre o remetente do bem ou serviço (contribuinte) e o estado de destino nas operações com bens e serviços destinados a consumidor final não contribuinte do ICMS”. Assim, a cobrança do Difal deveria ser feita através de Lei Complementar Federal, não bastando apenas lei estadual.


O Parlamento apressou-se e iniciou as deliberações dentro do que determinara a Suprema Corte e aprovou o PL 32/2021 que detalhava as regras do Difal em dezembro do mesmo ano. No entanto, faltava apenas “a sanção da lei Federal. E é aí que se inicia o imbróglio, após a desídia do presidente da República em sancionar o texto, que ficou esquecido na gaveta e só virou lei em 4 de janeiro de 2022” (Migalhas, 2022).

Consequências

A consequência imediata foi continuação da cobrança do Difal por parte de muitos Estados o que desrespeita a decisão da Corte Suprema. Com isso, surgiu uma avalanche de ações questionando a legitimidade da cobrança, usando como argumento principal o respeito aos princípios constitucionais da anterioridade e da noventena, respectivamente prescritos nos art. 150, III, b) e c) da Constituição Federal. De acordo com o contador e sócio da Consulcamp, Diego Santos em entrevista afirma que:

As empresas estão com muitas dúvidas. Há as que estão recolhendo para depois, caso seja possível, discutir um ressarcimento no futuro. Há quem não esteja recolhendo, mas não sabe avaliar os riscos, e outras buscando o poder judiciário para obter maior segurança jurídica (Âmbito Jurídico, 2022).

No plano econômico, os Estados enfrentarão problemas financeiros com a proibição da cobrança da citada alíquota na casa dos R$ 10 bilhões neste ano (Migalhas, 2022). Um enorme prejuízo para uma economia claudicante como é a de muitos Estados brasileiros, agravado em decorrência dos efeitos nocivos que o enfrentamento à pandemia de COVID-19 causou aos cofres estaduais.

Dentro do próprio Judiciário está havendo reverberações, pois o Tribunal de Justiça do Espírito Santo firmou entendimento de que a cobrança do Difal já em 2022 é legal. Na primeira instância, o magistrado julgou com base na decisão do Supremo Tribunal Federal do início de 2021, ou seja, a inconstitucionalidade das leis estaduais sem a existência de uma lei complementar federal que regulamente a matéria e a violação ao princípio da anterioridade tributária. No entanto, o presidente do Tribunal justificou a suspensão da liminar e da sentença do juízo inicial tomando por base o prejuízo da economia pública com a queda arrecadatória e também no seguinte:

Denota-se que concessão de lapso temporal para fins de organização entre os Estados da Federação, consoante a decisão que determinou a modulação dos efeitos a partir do exercício financeiro subsequente à conclusão (2022) –, possibilita a continuidade da cobrança tributária do ICMS-DIFAL, principalmente porque, ainda que leis locais sobre a matéria sejam produzidas, a princípio, não haveria que se falar em instituição ou mesmo majoração de novo tributo, de modo que, aparentemente, inexistiria sujeição à regra da anterioridade.

 

Entende-se com essa decisão que foi instaurada uma verdadeira anarquia jurisprudencial, onde cada Tribunal de Justiça estadual pode estabelecer um entendimento diverso daquele determinado pelo STF a respeito do Difal-ICMS.

A inconstitucionalidade da cobrança

Por fim, diante do que fora abordado, é evidente que a cobrança do Difal-ICMS no presente exercício financeiro é inconstitucional em violação ao princípio da anterioridade tributária que garante a previsibilidade ao contribuinte, proibindo que uma lei crie ou majore repentinamente tributos, impactando de forma severa a estrutura financeira dos cidadãos.

Como anteriormente citado, este princípio é uma garantia fundamental consagrada pela Carta Magna de 1988 e em hipótese alguma poderia ter sido desrespeitada. Os Estados não podem exercer os atos de império à sua disposição para, coercitivamente, avançar sobre o patrimônio dos contribuintes, pois de acordo com Scaff, os Estados “podem fazer bloqueios no mês que vem a quem não pagar o tributo. O caos estará instalado” (Jota, 2022).