“Quando um cidadão percebe que não pode exercer um direito constitucional seu por ele não estar regulamentado, ele se vê diante de um dilema: abandonar tal direito e seguir em frente para evitar 'desgastes' ou exigir pelos meios legais que os órgãos satisfaçam essa obrigação?”
1. Conceito
O
mandado de injunção é um dos remédios constitucionais, que alguns autores dizem
que surgiu no direito norte-americano na ação writ of injunction, com base na jurisdição de equidade, sempre quando
alguma norma se mostre insuficiente a tutelar direitos ou solucionar conflitos.
Outros autores acreditam que a citada ação surgiu no antigo direito português.
No ordenamento constitucional pátrio, o mandado de injunção está previsto no
inciso LXXI do art. 5.º da Constituição Federal, in verbis:
Conceder-se-á
mandado de injunção sempre que a falta de norma regulamentadora torne inviável
o exercício dos direitos e liberdades constitucionais e das prerrogativas
inerentes à nacionalidade, à soberania e à cidadania;
Percebe-se da leitura do citado inciso que o
mandado de injunção é remédio constitucional cabível para conferir a
efetividade de direito fundamental subjetivo não regulamentado.
Também está previsto na Lei 13.300 de 2016,
onde está disciplinada toda matéria relativa ao remédio constitucional em
comento.
2. Objetivo
O mandado de injunção não é cabível diante de
toda omissão do Poder Público. Segundo lição magistral de Alexandre de Moraes
(2018, p. 253) podemos afirmar que o mandado de segurança é cabível “tão só em
relação às normas constitucionais de eficácia limitada de princípio instrutivo
de caráter impositivo e normas programáticas vinculadas ao princípio da
legalidade por dependerem de atuação normativa posterior”. Assim, percebe-se
que nem sempre poderá ser admitido. Há outras hipóteses em que a lacuna de
regulamentação só caiba por ação direta de inconstitucionalidade por omissão,
mas veremos esses detalhes a seguir.
Também não cabe mandado de injunção diante de
normas constitucionais autoexecutáveis, ou autorização para o legislador criar
exceções a regras previstas e autoaplicáveis. Portanto, o seu cabimento é
exclusivo para sanar a omissão de regulamentação de norma constitucional.
3. Legitimidade ativa
Qualquer pessoa natural ou jurídica é parte
legítima para propor ação de mandado de injunção, desde que o exercício de um
direito, liberdade ou prerrogativa constitucional, inerente à soberania,
cidadania e nacionalidade estejam sendo inviabilizados por ausência de norma
reguladora que torne efetivos tais direitos.
4. Legitimidade passiva
O ente estatal responsável pela emanação da
norma regulamentadora estará no polo passivo da relação processual instaurada
pelo mandado de injunção. O art. 3.º da Lei 13.300/16 deixa claro quem são os
legitimados, e na sua segunda parte preceitua que “como impetrado, o Poder,
órgão ou autoridade com atribuição para editar a norma regulamentadora”.
Assim, fica claro que os particulares não
possuem legitimidade passiva no mandado de injunção porque não tem capacidade
de produção de normas regulamentares dentro do conceito de direito a ser
tutelado a ser reivindicado pelos impetrantes.
Dessa forma, pode-se concluir que os
particulares não podem formar litisconsórcio passivo juntamente com o Poder
Público.
5. Procedimento
Previsto na Lei 13.330/16, o procedimento do
mandado de injunção preceitua que a petição deverá preencher os requisitos da
lei processual e indicará além do órgão impetrado, a pessoa jurídica que ele
integra (art. 4.º).
Quando a ação correr por meio que não seja
eletrônico, a petição e os documentos que a instruem serão acompanhados do
mesmo número de vias que o dos impetrados (art. 4.º, § 1.º).
Ao ser recebida a petição inicial será
ordenado que seja notificado o impetrado sobre o conteúdo da inicial para que
no prazo de dez dias preste as devidas informações. E será dada ciência ao
órgão de representação judicial interessada para que ingresse no feito (art.
5.º, I e II).
A inicial será indeferida desde logo quando a
impetração for manifestamente incabível ou manifestamente improcedente (art.
6.º).
Da decisão do relator que indeferir a petição
inicial caberá agravo, em cinco dias, para órgão colegiado competente para
julgamento da impetração (art. 6.º, parágrafo único).
Findo o prazo para apresentação das
informações, o Ministério Público será ouvido no prazo de dez dias. Após isso,
com ou sem parecer ministerial, os autos serão conclusos para decisão (art.
7.º).
6. Competência
A Constituição Federal no seu art. 102, I, q,
preceitua que o mandado de injunção será julgado originariamente pelo Supremo
Tribunal Federal quando a elaboração da norma regulamentadora for atribuição do
Presidente da República, do Congresso Nacional, da Câmara dos Deputados, do
Senado Federal, das Mesas de uma dessas Casas Legislativas, do Tribunal de
Contas da União, de um dos Tribunais Superiores, ou do próprio STF.
Já o art. 105, I, h da Carta Magna prevê que
o mandado de injunção será julgado originariamente pelo Superior Tribunal de
Justiça quando a elaboração da norma regulamentadora for atribuição de órgão,
entidade ou autoridade federal, da administração direta ou indireta, excetuados
os casos de competência do Supremo Tribunal Federal e dos órgãos da Justiça
Militar, da Justiça Eleitoral, da Justiça do Trabalho e da Justiça Federal.
Para finalizar, o art. 121, § 4.º, V do mesmo
diploma, deixa claro que das decisões dos Tribunais Regionais Eleitorais
somente caberá recurso quando denegarem mandado de injunção.
7. Conclusão
Desta pequena explanação percebe-se que o
jurisdicionado tem a opção de se socorrer do Poder Judiciário para ver o seu
direito, que até então não está regulamentado, ser analisado pelo órgão
competente e, a depender das circunstâncias fáticas, ser dado provimento ao seu
pedido ou não.
Mesmo quando o procedimento da ação de
mandado de injunção ainda não estava regulamentado, o Supremo Tribunal Federal decidiu,
de maneira supletiva, como visto no julgado em que o procedimento da ação
injuncional tornou-se análogo ao mandado de segurança, conforme o julgado
abaixo:
MANDADO
DE INJUNÇÃO. QUESTÃO DE ORDEM SOBRE SUA AUTO-APLICABILIDADE, OU NÃO. EM FACE
DOS TEXTOS DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL RELATIVOS AO MANDADO DE INJUNÇÃO, E ELE AÇÃO
OUTORGADA AO TITULAR DO DIREITO, GARANTIA OU PRERROGATIVA A QUE ALUDE O ART.
5.º, LXXI, DOS QUAIS O EXERCÍCIO ESTÁ INVIABILIZADO POR FALTA DE NORMA
REGULAMENTADORA, E AÇÃO QUE VISA A OBTER DO PODER JUDICIÁRIO A DECLARAÇÃO DE
INCONSTITUCIONALIDADE DESSA OMISSÃO SE ESTIVER CARACTARIZADA A MORA
REGULAMENTAR POR PARTE DO PODER, ÓRGÃO, ENTIDADE OU AUTORIDADE DE QUE ELA
DEPENDA, COM A FINALIDADE DE QUE SE LHE DÊ CIÊNCIA DESSA DECLARAÇÃO, PARA QUE
ADOTE AS PROVIDÊNCIAS NECESSÁRIAS, A SEMELHANÇA DO QUE OCORRE COM A AÇÃO DIRETA
DE INCONSTITUCIONALIDADE POR OMISSÃO (ARTIGO 103, PAR-2., DA CARTA MAGNA), E DE
QUE SE DETERMINE, SE SE TRATAR DE DIREITO CONSTITUCIONAL OPONÍVEL CONTRA O
ESTADO, A SUSPENSÃO DOS PROCESSOS JUDICIAIS OU ADMINISTRATIVOS DE QUE POSSA
ADVIR PARA O IMPETRANTE DANO QUE NÃO OCORRERIA SE NÃO HOUVESSE A OMISSÃO
INCONSTITUCIONAL. – ASSIM FIXADA A NATUREZA DESSE MANDADO. E ELE, NO ÂMBITO DA
COMPETÊNCIA DESSA CORTE – QUE ESTÁ DEVIDAMENTE DEFINIDA PELO ART. 102, I, ‘Q’ -
, AUTO EXECUTÁVEL, UMA VEZ QUE, PARA SER UTILIZADO, NÃO DEPENDE DE NORMA JURÍDICA QUE O REGULAMENTE, INCLUSIVE QUANTO AO
PROCEDIMENTO, APLICÁVEL QUE LHE É ANALOGICAMENTE O PROCEDIMENTO DO MANDADO DE
SEGURANÇA, NO QUE COUBER. QUESTÃO DE ORDEM QUE SE RESOLVE NO SENTIDO DA
AUTO-APLICABILIDADE DO MANDADO DE INJUNÇÃO, NOS TERMOS DO VOTO DO RELATOR.
(STF
– MI: 107 DF, Relator: Min. MOREIRA ALVES, Data de julgamento: 23/11/1989,
Tribunal Pleno, Data de Publicação: DJ 21-09-1990 PP-09782 ELEMENT VOL-01595-01
PP-00001)
Portanto, fica claro que mesmo antes da
promulgação da Lei 13.300/16, a ausência de norma regulamentadora, nunca deixou
o jurisdicionado desamparado no tocante à aplicação dos seus direitos
constitucionais. Mesmo antes da entrada em vigor da citada lei, o procedimento
do mandado de segurança se tornou paradigma para o mandado de injunção, naquilo
que fosse cabível.