Introdução
O Mandado de Segurança (MS) é um dos mais relevantes e eficazes remédios constitucionais no ordenamento jurídico brasileiro. Embora este artigo não pretenda esgotar todo o seu conteúdo, ele visa fornecer uma compreensão clara sobre esse instituto fundamental para a proteção de direitos líquidos e certos.
1. O Que é o Mandado de Segurança? Conceito e Base Legal
O Mandado de Segurança é uma ação constitucional exclusiva do direito brasileiro, que se originou da evolução do habeas corpus e foi introduzida pela Constituição Federal de 1934. Atualmente, sua previsão fundamental encontra-se no art. 5º, LXIX, da Constituição Federal de 1988, nos seguintes termos:
"Conceder-se-á mandado de segurança para proteger direito líquido e certo, não amparado por habeas corpus ou habeas data, quando o responsável pela ilegalidade ou abuso de poder for autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições do Poder Público;"
Além da Constituição Federal, o Mandado de Segurança é detalhadamente regulamentado pela Lei nº 12.016/09. Seu art. 1º descreve:
"Conceder-se-á mandado de segurança para proteger direito líquido e certo, não amparado por habeas corpus ou habeas data, sempre que, ilegalmente ou com abuso de poder, qualquer pessoa física ou jurídica sofrer violação ou houver justo receio de sofrê-la por parte de autoridade, seja de que categoria for e sejam quais forem as funções que exerça."
Para aprofundar o conceito, é crucial entender o que se define como "direito líquido e certo". Podemos extrair uma valiosa lição do voto do ministro Celso de Mello no julgamento do MS nº 21.865-7/RJ:
“A noção de direito líquido e certo, para efeito de impetração de mandado de segurança, ajusta-se, em seu específico sentido jurídico, ao conceito de situação que deriva de fato incontestável, vale dizer, de fato passível de comprovação documental imediata e inequívoca”.
Hely Lopes Meirelles, uma das maiores autoridades sobre o tema, define o Mandado de Segurança como:
"O meio constitucional posto à disposição de toda pessoa física ou jurídica, órgão com capacidade processual, ou universalidade reconhecida por lei, para proteção de direito individual ou coletivo, líquido e certo, não amparado por habeas corpus ou habeas data, lesado ou ameaçado de lesão, por ato de autoridade, seja de que categoria for e sejam quais forem as funções que exerça."
É importante lembrar que o Mandado de Segurança é um procedimento especial. Portanto:
- Os detalhes processuais devem ser primariamente extraídos da Lei nº 12.016/09;
- O Código de Processo Civil (CPC) será aplicado de forma subsidiária, ou seja, para suprir lacunas ou complementar as regras específicas do MS.
2. Abrangência e Atos Coatores
A ação do Mandado de Segurança pode ser impetrada tanto contra atos discricionários quanto contra atos vinculados da Administração Pública.
- Nos atos discricionários, mesmo não sendo possível analisar o mérito administrativo da decisão, deve-se analisar os seus pressupostos de legalidade e de motivação suficientes à sua prática;
- Nos atos vinculados, devem ser analisados os motivos vinculativos da edição do ato, verificando se a autoridade agiu estritamente conforme a lei.
A autoridade coatora, conforme definido no art. 6º, § 3º da Lei nº 12.016/09, é "aquela que tenha praticado o ato impugnado ou da qual emane a ordem para a sua prática". É fundamental identificar corretamente a autoridade coatora para a validade da ação.
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3. Modalidades do Mandado de Segurança: Repressivo, Preventivo, Individual e Coletivo
Existem diferentes modalidades de Mandados de Segurança, que se distinguem quanto ao momento da lesão e à abrangência dos direitos protegidos:
3.1. Quanto ao Momento da Lesão:
- Mandado de Segurança Repressivo:
- Sua impetração ocorre diante de uma ilegalidade já cometida por um agente público ou uma autoridade;
- Busca reverter ou anular um ato que já produziu seus efeitos.
- Mandado de Segurança Preventivo:
- O impetrante se encontra na iminência de sofrer uma violação de seu direito por parte da autoridade;
- É necessário demonstrar justo receio de que um ato ou omissão esteja pondo em risco o seu direito, buscando evitar que a lesão ocorra.
3.2. Quanto à Abrangência dos Direitos:
- Mandado de Segurança Individual:
- Previsto no art. 5º, LXIX da Constituição Federal de 1988;
- É destinado à proteção de um direito líquido e certo de um único impetrante ou de um grupo de impetrantes com o mesmo direito;
- A doutrina e jurisprudência admitem como legitimados:
- Pessoa natural (física);
- Órgãos públicos despersonalizados;
- Universalidades patrimoniais;
- Pessoa jurídica nacional ou estrangeira, domiciliada no Brasil ou no exterior.
- Mandado de Segurança Coletivo:
- Previsto no art. 5º, LXX da Carta Política;
- Tem o mesmo objetivo do Mandado de Segurança Individual, mas visa proteger direitos de uma coletividade;
- Possui legitimados específicos para sua impetração:
- Partido político com representação no Congresso Nacional;
- Organização sindical;
- Entidade de classe;
- Associação legalmente constituída e em funcionamento há pelo menos um ano.
4. Competência, Prazo e Liminar no Mandado de Segurança
Aspectos processuais como competência, prazo e a possibilidade de pedido de liminar são cruciais para a efetividade do Mandado de Segurança.
- Competência para Julgamento:
- A competência para processar e julgar o Mandado de Segurança deverá ser sempre determinada pela sede funcional da autoridade coatora;
- Isso significa que o MS será julgado pelo órgão judicial ao qual a autoridade que praticou ou ordenou o ato impugnado está vinculada hierarquicamente.
- Prazo Decadencial:
- O prazo para impetração do Mandado de Segurança é decadencial de 120 dias, contados da ciência do ato a ser impugnado;
- Essa regra está prevista no art. 23 da Lei nº 12.016/09;
- É um prazo fatal: uma vez expirado, o direito de impetrar o MS se extingue, independentemente da existência do direito em si;
- No tocante a este prazo decadencial, a Súmula 430 do STF preceitua que este prazo não se interrompe e nem pode ser suspenso, reforçando seu caráter peremptório.
- Medida Liminar:
- É cabível pedido de medida liminar em ação de Mandado de Segurança;
- Para sua concessão, devem estar presentes os requisitos ensejadores, que são:
- Plausibilidade jurídica do pedido (fumus boni iuris): A fumaça do bom direito, indicando que o direito do impetrante é provável;
- Risco de dano irreparável ou de difícil reparação (periculum in mora): O perigo na demora, ou seja, que a espera pela decisão final da ação pode causar um prejuízo irreversível ao impetrante.
- A medida liminar é inerente à finalidade de proteção célere do direito líquido e certo e busca garantir que o objetivo do MS não seja frustrado pela passagem do tempo.
O Mandado de Segurança é, portanto, uma ferramenta vital para garantir que atos ilegais ou abusivos do poder público sejam coibidos, assegurando a proteção dos direitos fundamentais dos cidadãos.
