Inexigibilidade de Tarifa de Esgoto por Ausência de Prestação de Serviço, decide TJPE

Foto: Assis Lima | Ascom TJPE


Introdução:


Uma importante decisão proferida pela Quarta Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Pernambuco (TJPE) impacta diretamente a Companhia Pernambucana de Saneamento (Compesa) e o Conjunto Residencial Privê Bosque da Torre. A deliberação, unânime, afastou a cobrança da tarifa de esgoto referente ao período de 1995 a 2000, reconhecendo a ausência de prestação do serviço de tratamento pela concessionária. Este caso ressalta a importância da jurisprudência do STJ e dos direitos do consumidor em matéria de serviços essenciais.


1 – O CASO: Condomínio X Compesa e a Tarifa de Esgoto


A disputa judicial entre o Conjunto Residencial Privê Bosque da Torre e a Compesa girou em torno da legalidade da cobrança da tarifa de esgoto por um serviço que o condomínio alegava não ter sido prestado. A ação foi interposta pela concessionária buscando o recebimento de valores retroativos, mas a decisão do TJPE reverteu essa pretensão.


1.1 – Fundamentação da Decisão: Provas Técnicas e Inexistência de Serviço


A decisão colegiada, que deu provimento à apelação cível do condomínio, foi solidamente fundamentada em provas técnicas irrefutáveis.


  • Um laudo pericial detalhado, anexado aos autos do processo, atestou a absoluta ausência de prestação do serviço de tratamento de esgoto durante todo o período questionado (1995 a 2000).
  • A perícia revelou que todo o esgoto do condomínio era lançado in natura (sem tratamento) diretamente nas margens do Rio Capibaribe, evidenciando uma completa inexecução da atividade pela Compesa.


Tal fato é crucial, pois descaracteriza qualquer legitimidade para a cobrança tarifária, uma vez que a contraprestação pelo serviço não foi entregue.


1.2 – Jurisprudência do STJ e o Enriquecimento Sem Causa


A fundamentação do TJPE está em estrita conformidade com a jurisprudência consolidada do Superior Tribunal de Justiça sobre o tema.


  • O STJ entende que a cobrança de tarifa de esgoto é cabível apenas quando, no mínimo, parte das etapas de tratamento é realizada.
  • Contudo, a mesma jurisprudência, conforme destacado no voto do relator, desembargador Carlos Moraes, é enfática ao declarar que a inexistência integral da prestação do serviço descaracteriza por completo a legitimidade da cobrança, sob pena de configurar enriquecimento sem causa por parte da concessionária.
  • O despejo direto de dejetos em corpos hídricos, como constatado no caso em questão, configura não apenas a ausência de serviço, mas também um ilícito ambiental, reforçando a ilegalidade da cobrança.


2 – Ilegalidade, Ilícito Ambiental e o Abandono da Infraestrutura


Além da ausência de tratamento, a perícia técnica trouxe à tona outros elementos que corroboraram a tese do condomínio.


  • Foi constatado o estado de abandono da estação elevatória da Compesa, localizada nas proximidades do condomínio. A falta de equipamentos essenciais tornava a operação da estação inviável, confirmando a inoperância do sistema de tratamento.
  • A decisão colegiada do TJPE também ressaltou que o lançamento de esgoto bruto em um curso hídrico constitui crime ambiental, conforme previsto no art. 54, §2º, inciso V, da Lei nº 9.605/1998 (Lei de Crimes Ambientais). Essa conduta também viola flagrantemente as normas sanitárias estaduais.


3 – CONCLUSÃO: A Defesa dos Direitos do Consumidor e a Legalidade na Cobrança


Em síntese, a decisão do TJPE representa um marco importante na defesa dos direitos do consumidor e na reafirmação da legalidade na prestação de serviços públicos essenciais.


  • A comprovação da inexistência do serviço de tratamento de esgoto durante o período analisado, aliada à flagrante violação de normas ambientais e sanitárias, justifica plenamente o afastamento da cobrança da tarifa.
  • A decisão reforça o princípio de que a concessionária não pode auferir receita por um serviço que não foi entregue, evitando o enriquecimento sem causa.
  • A Compesa ainda possui a prerrogativa de interpor recurso contra a decisão, mas a solidez da fundamentação baseada em prova técnica e jurisprudência consolidada demonstra a força do posicionamento do Tribunal. Este caso serve de precedente para futuras discussões sobre a qualidade e a efetividade dos serviços de saneamento no Brasil.